Certa feita, um anjo foi encarregado da árdua tarefa de converter o seu Pai à elevada moral da humanidade. Semi-deus que era, Mahasiah, o anjo, galopou no vento, subiu a mais alta montanha e declarou a subserviência pública dos elefantes.
Era tempo de avalanches colossais e deus brincava de boneca, próximo às fontes recônditas de barro, às sombras dos eucaliptos. Mahasiah fez então rolar monte abaixo as pedras sagradas do peito dos Serafins e pronunciou as doze palavras cabalísticas seguidas do número da sabedoria, trinta e três.
Correndo através dos sulcos nas ladeiras, avançou sobre o pescoço de deus e fê-lo comer uma porção de barro mágico. Estava cansado da fama de sábio filósofo, de anjo ponderado e bom. Estava disposto a converter deus, mesmo que a força. Arrancou de si as cordas com as quais se enforcara por infinitos dezembros e amarrou o Pai a uma árvore. Chamou a si os trinta e três príncipes e os doze anciãos do povo, ordenando-lhes que atirassem as setas ardentes ao peito do Criador.
Debalde: resoluto, deus cuspia o sangue da garganta e sorria com o desdém típico das mariposas negras. Mahasiah perdeu completamente os cabrestos que enrolara sobre a crina e deixou que o Senhor se desvencilhasse, dando-lhe cento e quarenta e quatro dias de vantagem de corrida ao redor do monte de Sísifo.
Após acompanhá-lo, Mahasiah golpeou-o no lado direito do rosto por mil anos. Quando o Pai negou-se a dar a outra face, o anjo virou-o, a pulso, e bofeteou por mais mil anos. E passou mais cinco milênios surrando-lhe o lombo. Depois, cinquenta vezes o ofereceu em sacrifício aos deuses da floresta, até que sobreveio o jubileu.
Mahasiah transformou-se em inseto e, por dez mil anos, roeu o crânio insosso de deus. Transformou-se em cada uma das dez pragas e atingiu-lhe por dez dias o intestino...
Foi descansando em uma rocha no alto do Monte da Coruja que Mahasiah desistiu de seu desígnio. Caminhou até um lado escuro da galáxia e resolveu fazer ali sua morada. Sozinho, auto-declarou-se deus de si mesmo, rei das inexistências, residente das escuridões. Porém, após dois bilhões de anos de solidão, numa manhã de junho, Mahasiah mirou o infinito, estendeu solenemente a mão direita sobre os doze vazios e as trinta e três sombras inertes e disse:
- Que se faça luz.
E Mahasiah viu que tudo era bom...
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Edelvito Nascimento (nascimentoedelvito@gmail.com) é poeta e professor de literatura. Atualmente dirige o Grupo Concriz em parceria com os poetas Marcelo Nascimento, seu irmão, e Edmar Vieira, Diretor de Cultura do município de Maracás.
11 comentários:
Parabéns pelo conto. Mostrou mais uma especialidade.
Abraços poeta!
Muito Bom o Conto
como sempre você nos mostrando algo novo e fazendo que conheçamos um pouco mais dessa arte tão vasta e encantadora, a Poesia...
Parabéns!!!
Gosto do clima desesperado e alucinante dessa sua narrativa original (que fala da(s) origem(ns)). Sinto que você está no caminho certo, ou seja, perdido. Abraços.
JIVM
Muito bom, Vitor. Parabéns !
Parabéns, gostei muito do conto, é diferente, é estranho fiquei meio perdido nele.acho que foi por isso que gostei tanto...
Parabéns vitor!!Mais uma vez nos presenteando com um bom texto.. e que texto! adoreeiiii
Beijosss
Rapaz, que texto pirado. Se a estranheza é um caminho escolhido por você para trilhar nesta nova literatura, então está com êxito.
É como ler o apocalipse...
dificil e com muita simbologia
mas quando chega no final vc entende do que se trata
e faz com que vc leia novamente!
e isso que é o gostoso!
onde encontro mais poesias suas?
Muito interessante,
parabéns companheiro.
abraços
Profano, ou seja, bom.
muito interessante, além de poeta você também é um grante contista
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